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PÁGINA 4: ‘Mulheres não devem ensinar matemática’: o que dizia o decreto imperial que inspirou o Dia do Professor


Didática
O artigo quarto definia que o método adotado era o "ensino mútuo", também chamado de Lancaster. Criado pelo pedagogo e quaker inglês Joseph Lancaster (1778-1838), destacava-se por otimizar a transmissão do conhecimento, ao conseguir passar as aulas a um grande número de alunos, com poucos recursos, em pouco tempo, e com relativa qualidade.

Em texto publicado em 15 de outubro de 1927 na 'Revista do Ensino', edição comemorativa ao primeiro centenário da legislação, o professor Leopoldo Pereira descreve como era a "escola antiga", ou seja, este ensino do século 19.


"Antigamente, o mestre escola, de par com o vigário da freguesia, eram as mais respeitáveis personagens da aldeia. E como era então mais penoso o trabalho de ensinar e aprender! Não havia livros; o mestre tinha de fazer cartas para todos os discípulos. Depois do a-b-c, a carta de nomes, e depois a carta de fora. O mestre e os próprios menos obtinham dos negociantes cartas comerciais para leitura na escola; os próprios pais as forneciam, e quando faltavam, recorria-se aos cartórios, onde o mestre obtinha e às vezes comprava autos antigos, escritos ainda com pena de pato, que eram o terror da meninada. Eu mesmo ainda passei pelo suplício de decifrar as abreviaturas dos escrivães do tempo d'el rei", pontua.

A didática era baseada em repetição e memorização. E muita disciplina. E isto incluía as reprimendas, conforme dizia o artigo décimo-quinto da lei imperial: "os castigos serão praticados pelo método de Lancaster".

Sobre isso, professor Pereira também tratou na 'Revista do Ensino'.

"Não se compreendia então a escola sem o castigo corporal: a férula era para o mestre como o cetro para o rei ou o cajado para o pastor. Até nas aulas de latim e francês, que nossas principais cidades possuíam durante muitos anos, corria bem aceito o axioma que o latim, quando não entrava pelos olhos e ouvidos, devia entrar pelas unhas. Na escola primária a palmatória chamava-se santa luzia. Por que esse nome? Como se sabe, a crença popular venera Santa Luzia como advogada da vista, e nossos pais entendiam que a férula é que devia dar vista aos cegos", escreveu ele.

"Este método era o mais moderno da época para trabalhar com grande número de alunos em sala de aula. Ele permitia, por exemplo que alunos mais experientes fossem 'monitores', o que dava ao professor a possibilidade de ensinar turmas numerosas", explica o historiador Almeida.


O historiador pontua que na Constituição de 1824 o método já é citado. Um dos seus defensores foi o influente jornalista e diplomata Hipólito José da Costa (1774-1823). "Vale ressaltar que este método representava, de alguma forma, o que de melhor existia na época", completa Almeida.

Para o pesquisador Martins, independentemente de qual fosse o método escolhido, a menção a um sistema didático na legislação deve ser ressaltada. "Porque, pela primeira vez, se coloca a necessidade de uma base nacional comum na educação básica", reconhece.

Depois da lei
Mas, apesar de um passo importante, a legislação não significou que, de uma hora para outra, o ensino se tornou universal no país. "A lei determinava que as províncias criassem as escolas. Algumas criaram, outras empurraram com a barriga", avalia o historiador Rezzutti.

"Na realidade, pouca coisa mudou", diz Almeida.

"A lei mostrava uma vontade do novo governo e não a realidade de fato. O que tínhamos ali era a condição legal para a realização de um projeto de educação. Porém não possuíamos recursos financeiros e materiais para que todas as demandas fossem solucionadas e as metas alcançadas. Além disso, o Brasil não contava com o preparo de profissionais para atuar na educação e mesmo com a previsão de formação para os mestres e mestras na lei, faltavam aqueles que poderiam trabalhar nesta formação. Ao mesmo tempo, só tinham condições de acesso à educação a elite, já que neste momento a população deveria se concentrar no trabalho para atender suas necessidades básicas. E até 13 de maio de 1888, os negros não tinham garantias nenhumas de acesso. E, nesse tempo, a maior população no Brasil eram os negros e os pobres. Sendo assim, somente uma pequena parte da população teria acesso", enumera o historiador.

Almeida lembra que, mesmo depois da nova legislação, muitas famílias ainda seguiam contratando preceptores para educar seus filhos.

"Falava-se em ensino público e gratuito mas, a rigor, ainda era muito excludente", confirma o pesquisador Martins. "Era um Estado imperial e centralizador. Não havia essa ideia que nós temos hoje de universalização do ensino, esta concepção de Estado social."

Outros países
Desde 1994, a Organização Mundial das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) reconhece o 5 de outubro como Dia Mundial dos Professores. Esta data é lembrada em muitos países.

Nos Estados Unidos, o Dia do Professor é comemorado na primeira terça-feira de maio. Boa parte dos países latino-americanos celebram a festividade em 11 de setembro, em memória da morte do pedagogo, jornalista e político Domingo Faustino Sarmiento (1811-1888), ex-presidente da Argentina - data esta estabelecida na Conferência Interamericana sobre Educação realizada no Panamá em 1943.




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